Taí uma das palavras que mais tem discussão hoje em dia: sincretismo.
Tem gente que só de ouvir já fica de cabelo em pé. Para algumas pessoas, o sincretismo virou quase um sinônimo de tudo o que as religiões de matriz africana tem que eliminar. Mas não é bem assim.
No senso comum, sincretismo significa simplesmente fazer a relação dos santos com os orixás. De um jeito um pouco mais complexo, podemos dizer que a maioria das pessoas vê o sincretismo só como a imposição do catolicismo sobre as crenças dos africanos. Ou como uma estratégia de sobrevivência que africanos tiveram que adotar quando foram obrigados a serem católicos.
Mas essa é uma visão antiquada e errada. O sincretismo é um processo bastante complexo e com muitas interpretações diferentes, e não significa só a imposição de uma cultura sobre outra.
Podemos dizer que o sincretismo é uma mistura de culturas diferentes. Isso pode acontecer porque as pessoas enxergam uma relação entre elementos diferentes, ou porque um dos lados foi obrigado a aceitar a cultura do outro. Ele acontece de muitas maneiras, mas no fim sempre gera um novo elemento cultural.
Na Umbanda, por exemplo, há uma mistura de elementos africanos com católicos. Mas também tem sincretismo de duas culturas africanas diferentes, a bantu e a yorubá, e das culturas ameríndias. Todas essas misturas podem ser consideradas sincréticas.
O problema está no processo. O sincretismo com o catolicismo aconteceu, muitas vezes, por imposição da religião dominante, o que foi muito violento porque está ligado a toda a questão da colonização e da escravidão. Já com as religiosidades ameríndias e com outros povos africanos vai ser diferente, porque é um encontro entre os oprimidos e a relação entre eles vai ser de convivência e convergência. E até mesmo com o cristianismo, uma parte do sincretismo vem do catolicismo popular, das festas dos santos, das orações, que também não faziam parte da religião oficial.
Você pode trocar a palavra sincretismo por várias outras: mestiçagem, hibridismo, mistura. Os antropólogos e pesquisadores que estudam esse processo dão diferentes nomes e tem várias interpretações. Vale lembrar, também, que isso tudo não acontece só na religião. Pinturas, música, comidas e muitos outros elementos da cultura de uma sociedade podem ser sincréticos.
Mais importante do que combater o sincretismo é entender como e porquê ele acontece. Onde existiu opressão e onde aconteceu a convergência. E a partir daí, sim, entender o que vale manter no seu dia a dia como macumbeiro e o que você prefere deixar de lado.
Referências
"Repensando o Sincretismo" - Sérgio Ferreti
"O Pensamento Mestiço" - Serge Gruzinski
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